sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Moore, Promethea e a vitória da persistência

Nem sei quantos dos poucos atuais leitores deste Blog são fãs de quadrinhos. Sei menos ainda quantos destes lêem frequentemente e tanto quanto quantos lêem quadrinhos adultos. Mas já estava na hora de eu falar deste gênero de arte muito caro na minha vida, que me acompanha desde a infância (não, não sou daqueles que aprenderam a ler com quadrinhos, mas eles me ensinaram a ser curioso) e, principalmente, do sub-gênero que me mantém gostando de ler coisas com figuras (e que figuras! cada vez mais me afasto de desenhistas convencionais e me aproximo de verdadeiros ARTISTAS da arte-seqüencial).

Quantos de vocês já ouviram falar de Alan Moore? Bom, eu não conheço muito do início da carreira dele, mas acredito que ele tenha começado a fazer sucesso e mostrar quem é em sua fase em O MONSTRO DO PÂNTANO, pelo selo VERTIGO da editora americana DC COMICS. Apesar de ainda comedido e disposto a fazer quadrinhos de leitura razoavelmente fácil, Moore já tentava inserir algum conteúdo na cabeça de seus leitores, tanto já em O MONSTRO DO PÂNTANO, quanto nos enormes sucessos que emplacou nos anos 1980, com um pouco mais de nome e liberdade para inovar. Estou falando de V DE VINGANÇA (se você procurar HOJE por V, é capaz que encontre outro autor nos créditos, mas é que, a pedido de Moore, a DC COMICS retirou seu nome de todos os títulos que não estavam sob a condição de "direitos do autor" e colocou um pseudônimo de sua opção no lugar), WATCHMEN (outra que está com pseudônimo) e BATMAN - A RISADA MORTAL.

Nos anos 1980, Moore também criou (pelo menos a versão atual de) MIRACLEMAN e JOHN CONSTANTINE, no título HELLBLAZER, que faz muito sucesso até hoje, além de ter escrito uma história interessantíssima do SUPERMAN, famosa até hoje, considerada por muitos a melhor da personagem escrita em todos os tempos.

Mais pra cá, na história, Moore passu a ter mais liberdade criativa. Quando Moore quer publicar quadrinhos, ele não se limita simplesmente a escrever uma história com começo, meio e fim, para os leitores entenderem facilmente o que ele quer dizer e vender milhões de exemplares de cada álbum seu. Moore quer mais. Ele instiga o leitor, faz com que ele concentre sua atenção a cada detalhe da página, a cada letra do diálogo, ele cria subtextos, com roteiros em camadas, cada vez mais translúcidas, fazendo o leitor perceber, a cada vez que pega o gibi na mão, uma coisa nova que, tendo conhecimento do "plot" ainda por vir, fica mais fácil de identificar e, quando da primeira vez, não conseguiu captar (o famoso "nossa, não é que ele sabia mesmo o que estava escrevendo?"). Sem contar a variedade a que ele sumete os quadrinhos no quesito "linguagem visual".

Isso fica muito evidente em DO INFERNO, quando ele se associa a um desenhista (me foge o nome, agora) cujo traço sujo ao extremo (sujo é diferente de feio), quase ininteligível, às vezes, para que o leitor se concentre nos diálogos, igualmente pesados, mas que vão escoando toda a trama para o leitor, cheios de referências históricas reais (é a história do "Jack, o Estripador", que está sendo contada) que, se você não ficar 100% atento, lhe escapam com facilidade. Confesso que, ao ler DO INFERNO, chegava a me cansar da leitura, de tanta informação inserida na revista; daí a demora para terminar os álbuns.

Depois dessa biografia toda, e chegando mais perto de onde quero pousar, mais recentemente, Moore acertou com a DC o lançamento de um selo seu, onde teria total liberdade de criação: o ABC, ou, por extenso America´s Best Comics. Aqui, Moore criou títulos sensacionais, tais como A LIGA EXTRAORDINÁRIA, que você deve conhecer mais pelo péssimamente adaptado filme com Sean Connery do que pelos excelentes quadrinhos.

Neste selo, mais recentemente, começou a ser publicado, aqui no Brasil, um título chamado PROMETHEA, que está saindo pela PIXEL, no excelente trabalho da editora, feito na revista PIXEL MAGAZINE.

O carro-chefe da revista é HELLBLAZER (CONSTANTINE, para os menos íntimos). DMZ desponta como algo interessante, e PLANETARY é fantasticamente exótica e curiosamente fascinante. E tinha PROMETHEA. Se você parar pra ler os primeiros números de PROMETHEA, vai ler uma historinha de super-heroína estranha, com um mote bizarro e localizado numa diegese, no mínimo, inapropriada. Era sempre a última história que eu lia no mix da revista e, confesso, só lia pra justificar o dinheiro gasto.

Eu não estava entendendo o que Moore queria dizer com aquilo. Confesso que minha leitura vinha sendo superficial, mas o que esperar de uma leitura de quadrinhos de super-heróis no meio de tanta história intelectualmente rica e fascinante? De repente, Moore me pegou.

Na minha persistência em ler PROMETHEA, acabei pegando o mote real da história, e percebi que Moore quer, na realidade, discutir a ficção em si, e mostrar, em PROMETHEA, as possibilidades de uma viagem que nem todos os psicotrópicos lisérgicos vão te dar. Ele entra no âmago do "fazer ficção", mostrando que, se não houvese o escapismo do "faz-de-conta", a humanidade já teria sido extinta, seja através de suicídio, seja matando-nos uns aos outros (o que fazemos de melhor, admitamos).

E isso é só o começo, porque, como escrevi anteriormente, essa é só a primeira leitura.

Nem lembro mais quantos números de PROMETHEA saíram pela PIXEL MAGAZINE, mas, juro, espero o mês inteiro para ler essa história, que já é, de longe, a minha favorita no mix.

Recomendo profundamente.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

As várias facetas do "fenômeno" TROPA DE ELITE

Você já deve ter assistido ao filme TROPA DE ELITE. Sabe que ele é, realmente, um bom filme, com um mote interessante, um roteiro bem escrito, com uma história bem contada e bem dosada, bons atores fazendo bem seus papéis, com um destaque especial para Wagner Moura, semre muito bem, mas, desta vez, dando um show em seu papel, uma fotografia bem localizada, cheia de contraste (até lembra, um pouquinho, a fotografia dO INVASOR), com enquadramentos bem planejados (tem closes fortes e freqüentes, mas não como OLGA, que chegava a irritar),uma montagem flúida, rápida e bem técnica, sem contar o trabalho do diretor, que foi, realmente, muito bem neste filme.

O problema com TROPA DE ELITE não é esse. Competentemente, o filme angariou milhões de pessoas às suas salas de cinema, muito "ajudado" pela publicidade indesejada da pirataria, que já tinha o filme antes do cinema, mesmo que com ligeiras alterações (confesso não ter visto tanta diferença assim, apesar de ter tido a impressão de que, no cinema, a montagem estava mais decidida, menos insegura), mas, mesmo assim, competentemente.

O que me preocupa é a impressão de que as pessoas não entenderam o sentido do filme. Apesar de o filme estar bem dosado e não ter nenhuma cena de violência gratuita, os espectadores do mesmo parecem ter sido vidrados pela ação frenética e a tensão do filme, deixando de lado o discurso politizado e muito bem colocado do diretor/roteirista. Jovens que saem da sala de cinema cantando o funk do "parapapa", sem perceber que ele é uma ode àquele poder paralelo, que aterroriza, hoje, não mais só o Rio de Janeiro, mas o Brasil interio, viciando nossos jovens, corrompendo nossos policiais.

Gente que toca o mesmo funk em quase todos os carros, hoje em dia! O cara vai trabalhar escutando aquilo!

Depois disso, não é difícil pensar que ninguém sentiu o "tapa na cara" da classe média que o filme dá, bem dado, e dentro dessa classe e das pessoas que sofrem o golpe eu preciso me incluir, apesar de eu ter consciência de que quero mudar a minha atitude, e venho mudando de uns tempos para cá.

Tudo, e eu disse TUDO, o que o filme mostra é a mais absoluta verdade! A polícia é, sim, corrupta. Sim, existem excessões. Sim, o tráfico PRECISA acabar, e o primeiro setor que precisa se mexer para que isso aconteça é a classe média brasileira.

Isso porque somos nós que compramos as drogas. Nós, que, um dia, fomos universitários e, sim, fizemos parte de festas onde rolou muita coisa além da bebida, e NÓS TODOS sabemos disso, NÓS TODOS somos hipócritas o suficiente pra lamentar todos os assassinatos, assaltos e seqüestros-relâmpago dos quais somos vítimas, nos alegamos inocentes, mas não somos, e todos sabemos disso.

Não, não precisamos concordar em gênero, número e grau com os métodos utilizados pelo BOP dito "fictício" do filme (eu adoraria que o BOP de verdade viesse a público, não pra desmentir o filme, mas pra dizer que é tudo verdade), mas temos que saber que Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Brasília e tantas outras cidades estão em guerra. E, para vencer uma guerra, é necessário agir com táticas de uma.

Não estou dizendo para nos fardarmos todos e sairmos matando traficantes. Só estou dizendo: deixem as pessoas fazerem seus respectivos trabalhos, e colaboremos, não nos tornando consumidores daquilo que financia essas verdadeiras guerrilhas não-reconhecidas, que estão tomando conta do nosso país.

P.S.: Não comprei a versão pirata de camelô algum, não a havia assistido antes de o filme sair no cinema, assisti o filme primeiro no cinema e só assisti a versão pirata porque uma caiu no meu colo e fiquei curioso em saber das diferenças.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

QUADRINHOS E CINEMA parte 2

Você que leu a parte anterior desse artigo deve estar pensando “ou esse caras estão loucos ou eu nunca mais vou assistir um filme baseado em quadrinhos na minha vida”. Calma. As adaptações das quais estamos falando podem dar certo.

Dando uma volta pela sua locadora (se você tem vídeo-cassete, vá logo, ou seu aparelho vai perder a serventia), você poderá, e provavelmente vai, encontrar muita coisa boa do gênero. Filmes que não foram exatamente um sucesso de propaganda, muito menos de bilheteria ( muitos deles não deram nem o gosto das telonas aos brasileiros), mas merecem sujar o cabeçote do seu vídeo.

Dando mais uma voltinha pelas editoras, novamente, começaremos com a imortal Marvel, que encabeça a lista desses filmes “legaizinhos”. Encabeça porque tem Blade. Um filme estrelado por ninguém menos do que Wesley Snipes, feito com perfeição, mas que teve uma segunda versão que nem passou pelas nossas salas de cinema. Um crime. Junto com Blade, vêm Conan (clássico para fãs de Schwarzeneger) e sua amiga Xena, cada um em seus filmes.

Mas a DC também marcará presença nessa lista. Quem nunca deixou de dormir mais cedo na Segunda-feira só por que ia passar O Corvo na Tela-Quente? Esse filme é maravilhoso... Ainda, para acompanhá-lo, estão o filme do Aço e os pilotos das séries Mulher-Maravilha e Lois e Clark, que valem o tempo que duram.

Por final, é impossível deixar de citar dois filmes que, apesar de quase ninguém se lembrar deles, são o máximo em adaptações de HQ´s para a grande tela. O primeiro é o Oscar de maquiagem, feito com extrema boa vontade, contando com Madonna em um papel coadjuvante. Apesar de sérias restrições orçamentárias, o filme tem um roteiro bem bolado, boa ação e situações constrangedoramente engraçadas, Dick Tracy vale muito mais do que você pagaria para assistí-lo.

E, por final, mas ao contrário de ser o menos importante, está aquele que, provavelmente, tem a narrativa, o roteiro, a cenografia e o figurino mais fiéis aos originais na história. The Rocketeer é envolvente e empolgante, sendo, para este que vos escreve, o melhor filme de todos os citados nesta matéria, colocando o melhor dos anteriores “no chinelo”. Se sua locadora não tem essa fita, processe o dono (brincadeirinha). É um crime contra os comicmaníacos não ter um exemplar desse na prateleira.

Tudo isso mostra que é possível, para não dizer fácil, adaptar um herói dos gibis para o cinema. Só precisamos de boas idéias e muita boa vontade, regados por algum dinheiro. Ah se algum produtor tivesse a grana...

Continua...

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

QUADRINHOS E CINEMA parte 1

Por que não dá certo

Na longínqua década de 1890, década de imensos avanços artísticos e tecnológicos para toda a humanidade, estavam surgindo e começando a engatinhar duas formas de arte e entretenimento revolucionárias, distintas e, ao mesmo tempo, tão próximas quanto temos um dedo do outro: o eloqüente e todo-poderoso cinema e a humilde, porém também toda-poderosa história em quadrinhos. Essas formas de expressão tão claramente distintas entre si têm tanto pontos em comum quanto os DNAs de irmãos gêmeos. Para começar, o roteiro é escrito quase da mesma forma e o que vemos no produto final das HQs é cada vez mais freqüentemente usado na chamada pré-produção dos filmes que vemos na grande tela. Porém, não vamos nos alongar muito nessa questão. Aonde queremos chegar é que com tão grande proximidade seria impossível segurar uma certa intertextualidade entre as duas áreas.

Mas não pense que foi sempre assim fácil criar adaptações de HQs para a telona. Uma imensa gama de filmes péssimos (é claro que não péssimos estilo Glitter ou Xuxa e os Duendes, nosso patamar é um pouco mais acima), tão ruins a ponto de as editoras recolherem as fitas de vídeo, deixando no mercado apenas as cópias piratas sobre as quais não obtinham o controle desejado. A editora em questão é a Marvel comics, cujo filme do Quarteto Fantástico (não esse com a Jéssica Alba, um outro, feito na década de 1990), de baixo orçamento e requintes de filme “trash” (o Coisa parecia uma tartaruga ninja, o Reed Richards é literalmente de borracha e a mão do Sr. Destino se move após a decapitação), foi tirado das prateleiras antes mesmo de ter sido feita uma cópia legendada em português. E a Marvel é a mestra em questão de fazer filmes ruins, haja vista todas as tentativas de Capitão América (blérg), as esforçadas versões de Hulk com Lou Ferrigno (Uma delas com a aparição de um raquítico e estúpido Thor), o filme para TV da Geração X e outros.

E como a concorrência lá nos “States” é acirrada, a DC comics não poderia ficar de fora dessa briga pelos piores filmes de todos os tempos. A quantidade é menor, mas a qualidade não deixa de decepcionar. Veja como exemplo o filme da Liga da Justiça (de vez em quando o SBT passa esse filme durante a tarde) em que metade dos heróis é gorda (pasme: o Flash é quase um balofo!) e a outra está pelo menos fora de forma. A acrescentar um roteiro fraco, com diálogos ruins e um fim esdrúxulo. Os efeitos não são ruins, mas estão longe de serem bons. Foi isso o que fizeram com a Liga. E a DC não pára por aí, também, não! Com certeza você já assistiu Batman: o retorno, Batman: eternamente e o clássico da comédia Batman e Robin (os dois últimos dirigidos pelo difamado diretor Joel Schumacher), onde nosso cavaleiro das trevas é tratado mais ridiculamente do que era na famosa série da década de 70 (ai!!!!!!!).

E não são apenas as duas maiores editoras que se reservavam ao direito de fazer filmes idiotas. Há ainda filmes de editoras menores, com menor responsabilidade, que não ficam muito a desejar na produção de pérolas. Tank Girl, Barb Wire (com a “excelente” atriz Pamela Anderson), o filme para a TV da Witchblade (piloto para a série), Spawn e muitos outros que, de tão ruins, nos fogem à cabeça de vez em quando, levando-nos a crer que, apesar de tal semelhança e reciprocidade, quadrinhos e cinema nunca deveriam ter tentado se misturar. Se pensássemos todos assim, Deus sabe o erro que estaríamos cometendo.

Continua...